terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Entre Canários e Pardais


Sexta-feira passada (29/01/16) fui surpreendido no meu trabalho com uma notícia ruim, uma tia que estimo muito sofreu um derrame, por mais que saibamos que a idade é implacável e ela já com mais de 90 complica, ainda mais estando no Brasil, “mérito” que não entrarei aqui neste texto.
Saí ao sábado pela manhã, pois sexta não consegui chegar cedo em casa, cheguei depois das 20 horas do trabalho e até arrumar as coisas e ver o carro seria mais difícil, e com o agravante de me recuperar de um acidente, estou um pouco debilitado para pegar estrada, principalmente a noite, as RJ 116 e RJ 106 são dignas para 4×4 e não para um carro de passeio, mais de 300 km de viagem.
Chegando lá fui para o hotel deixar minhas coisas e logo fui para o hospital, vi minha tia e constatei o sofrimento não só dela como de muitas pessoas em um leito sem ar condicionado, em um calor de quase 40 graus, sobrevivendo pelo trabalho heroico das enfermeiras e médicos.
Presenciei a despedida de uma família com uma paciente, cena triste que nunca sairá da minha cabeça, a mesma faleceu no domingo, pessoas que deveriam estar em uma UTI e não em um simples leito.
E o dia acabou, domingo pela manhã, cansado e triste fui novamente ao hospital, logo depois fui andar um pouco pelas ruas para refrescar minha cabeça, estacionei meu carro e fui para a praça do centro da cidade e fiquei lá sentado, algumas pessoas estavam na mesma praça, aproveitando a sombra, fugindo do sol que castiga o cidadão fluminense. Alguns bêbados, alguns idosos, alguns jovens, democrática pracinha.
Muitos carros transitavam ao entorno da praça, alguns com sons alto, me fez achar estranho, pois o maior privilégio de se morar em uma cidade pequena é poder usar pouco o carro, justamente o contrário que ocorre na cidade e certa hora notei que estava sozinho na praça, um luxo para mim, poder ficar comigo mesmo,  ainda que seja por pouco tempo, a solidão nos fortalece, nos faz pensar, nos faz balancear nossas atitudes e escolhas, pensar no misterioso futuro, na vida que levo, quase mecânica e insana.
Foi quando a minha vida relacionada a este pequena cidade passou na minha cabeça como filme, lembro que nos primórdios dos anos 80, meu pai com seu Fuscão nos levava para a casa dos meus avós, para passar 1 semana, olha que eu esperava o ano todo por isso, lá tinham animais soltos, hortas, árvores frutíferas, um sonho que acabou cedo, pois com o falecimento do meu avô, a propriedade foi vendida e com ela foi um pedaço de mim.
Depois nos anos posteriores começamos a ficar na casa desta minha tia que está mal, sempre muito prestativa, não só com a gente, mas com a família toda, minha mãe mesmo morou com ela durante a adolescência, que dívida enorme temos com ela, gratidão é o mínimo que podemos ter com ela, sua vida foi servir aos outros por opção, deste da antiga companhia telefônica até o posto de saúde onde trabalhou até se aposentar, esforço que nosso Estado do Rio de Janeiro faz questão de esquecer como faz com a maioria dos aposentados, logo na hora que eles mais precisam.
Foi quando que notei que não estava mais sozinho na praça, estava cercado de canários e pardais, logo percebi que as respostas para meus questionamentos estava ali diante dos meus olhos, que a simplicidade é o grande segredo para se trilhar neste sinuoso e longo caminho que é a vida.

Leandro Sauerbronn

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